O Luxemburgo é talvez o mais obscuro e mais desconhecido país
da União Europeia e isso aguçou-me o apetite de o conhecer.
É obscuro pelo seu sistema financeiro, sempre muito citado
aquando de escândalos de branqueamento de capitais e de deslocação de sedes
financeiras, e é obscuro porque quase todos que aqui vêm é apenas por motivos
laborais, e é essa a imagem que fica, um país sempre em modo profissional.
O Luxemburgo não prima por uma ostentação da qualidade de
vida, não prima por grandes carros a cruzar as suas ruas, nem por restaurantes
faustosos ou por eventos mediáticos, mas percebe-se facilmente por que é que
é aqui que está o maior poder de compra de toda a UE.
Quando cruzamos as suas
pequenas ruas, vemos todas as grandes marcas presentes, não descortinamos
casas abandonadas e raros são os pedintes. A presença de transportes públicos
faz-se sentir quer com as inúmeras linhas de autocarro, quer com as inúmeras
linhas de comboios suburbanos que servem as pequenas localidades do grão-ducado. Aqui vive-se bem.
Mas, acima de tudo, o que fica na cabeça é a calma que a
cidade apresenta. Tudo parece ser feito para ser calmo e atempado, previsível e
com qualidade. Em muitas coisas faz-me lembrar Esposende.
Tudo encerra às 23:00
e no domingo os cafés começam a fechar às 17:00, ficando apenas os bares dos
hotéis e o McDonald’s abertos.
Mas, como em todos os locais com deslocados profissionais, havia uma interessante quantidade de bares e de restaurantes que animavam para o
jantar, com diversos grupos de convivas a aproveitarem as promoções e as
bebidas a preços razoáveis. Relembro que o Luxemburgo figura no topo em termos
de consumo de álcool a nível mundial e agora fiquei a perceber porquê.
O seu turismo parece direccionado para uma clientela calma,
mais envelhecida e que procura a qualidade da oferta em detrimento das grandes
multidões. Tal como na Suíça, a indústria de turismo luxemburguesa prima por
atrair quem vem gastar dinheiro em detrimento do número de visitantes e quer
atrair quem quer conservar o que vê, em vez de se adaptar ao gosto de quem os
visita. E isso faz muita diferença.
Se por um lado a zona europeia se destaca claramente, com os
edifícios do tribunal de contas europeu, Filarmónica europeia e a Universidade
do Luxemburgo a chamarem a atenção, dando uma ambiência cosmopolita à cidade, por outro lado, a menos de 100 metros de distância, temos um bosque junto ao riacho e rodeado de
casas datadas dos anos 20 que dão um ar rural àquela zona da cidade, como se
estivéssemos em alguma aldeia do Gerês no meio da serra.
Em contra-ciclo com a
esmagadora maioria dos meus colegas de filiação política, este tipo de país não
me causa tremores e ódios, já que em vez de se construírem arranha-céus, pistas
de gelo artificiais e patrocinar eventos desportivos como os novos pináculos da
civilização ocidental que florescem na península arábica, apostou-se em
subsídios de renda, acesso generalizado ao serviço nacional de saúde e fundos
de reforma para quem contribui.
No
Luxemburgo não existem histórias de salários milionários, de polícia a conduzir
Ferraris nem de festas milionárias mas também não existem histórias de bebés
prematuros deixados a morrer à porta do hospital porque o seguro dos pais não
cobre o tratamento de prematuros, e isso é o que separa uma sociedade dum
amontoado de pessoas.
Apesar de
relativamente pequeno, o Luxemburgo é do tamanho do concelho de Viana do Castelo, apresenta
alguns produtos muito típicos e muito arrigados no seu dia-a-dia como o leite,
a carne, a cerveja e o vinho. Para a sua dimensão, a carta de vinhos
luxemburgueses é algo impressionante. O país dispõe de uma produção leiteira com
elevada qualidade onde o leite biológico é quase norma, as destilarias são
endémicas e todos os restaurantes fazem gala na carne de vaca luxemburguesa. Nas suas ruas é possível ouvir uma grande miscelânia de
línguas, e toda a gente parece estar em rotação.
Nas mesas dos restaurantes as
conversas são maioritariamente sobre negócios, política, idas e vindas pela
Europa e ouve-se falar inglês com sotaque americano, australiano e ainda ouvimos
russo amiúde por estas ruas mas também ouvimos muito português.
Aqui parece que
existem 3 grandes classes de emigrantes portugueses, os dos serviços
auxiliares, os das financeiras e os políticos. Em todo o lado ouvimos
português, muitas vezes já nem era preciso falar em inglês ou francês bastava
dizer “Desculpe, mas sabe onde fica?” para termos uma resposta na nossa língua
Estes, segundo os nossos atuais governantes da coligação
PSD-CDS e Miguel Relvas, foram os portugueses que saíram da sua zona de
conforto e foram procurar novas oportunidades, foram demonstrar a qualidade da
mão-de-obra portuguesa além fronteiras, enriquecer o seu conhecimento e aprender
novas artes e procedimentos para voltarem com mais capacidades e habilitações
para o seu país natal.
Para mim estes emigrantes são em grande parte os danos
colaterais dos pseudo-neo-liberais que tomaram conta dos destinos de Portugal e
da sua opinião pública e que revestidos dos seus telemóveis inteligentes, dos
seus cursos em gestão e dos seus termos em inglês reciclaram o mote dos anos 30
e 40 da França ocupada onde a emigração era uma exaltação nacional e não uma
consequência da submissão à Alemanha em que a França vivia.
Os finlandeses,os noruegueses, os austríacos, os suíços ou
os luxemburgueses não precisam de ir para o estrangeiro demonstrar a qualidade
da mão-de-obra dos seus países, fazem-no através da excelência dos produtos que
fazem nas suas próprias terras.
O Luxemburgo e a sua calma ficaram para trás e fez-se luz sobre mais um obscuro destino.
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