segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Apulienses e Fangueiros, Amigos para Siempre!*

A forma como a reorganização administrativa do território das freguesias foi encarada por muitos Municípios, revelou-se um flagrante exemplo de como um certo bairrismo saloio pode, por vezes, toldar a racionalidade que deve presidir à boa gestão autárquica.
Penso, por exemplo, em Barcelos, que, no seu orgulho de «maior concelho de Portugal», opôs-se à redução das suas 89 freguesias (!) para 61, sem que conseguisse justificar a pertinência de tão elevado número.
Uma posição rígida que contrastou, totalmente, com a do Município de Lisboa, o qual, muito antes de o Governo ter iniciado o processo de reforma das freguesias, decidiu desencadear o seu próprio processo de reorganização autárquica.
Com as vagas de mobilidade no último século, dentro ou para fora do país, ou até mesmo com a redução drástica dos nascimentos, muitas freguesias acabaram por ficar descaracterizadas na sua composição. O mundo está em constante mudança e as realidades locais também.
A reforma do mapa autárquico era, portanto, um processo que estava escrito nas estrelas e que, mais cedo ou mais tarde, iria colocar-se aos Municípios.
Tal acabou por suceder em 2012, tendo Esposende, quando confrontado com a necessidade de reorganizar as suas freguesias, optado por seguir o exemplo do seu vizinho concelho de Barcelos.
A autarquia de Esposende, na sua totalidade, manifestou-se contra qualquer redução do número de freguesias do concelho (então de 15), sem ter sequer equacionado os eventuais méritos (por exemplo, reforço da competitividade, redução de custos ou maximização dos investimentos) que a agregação de algumas das suas freguesias poderia comportar, sobretudo quando estas apresentavam nítidas disparidades na sua composição.
Basta, a esse título, recordar os dados dos Censos 2011, dos quais decorre que, naquele ano, no Concelho de Esposende, com 34.254 habitantes, 7 das suas então 15 freguesias tinham menos de 1.500 habitantes, por contraponto, por exemplo, com Marinhas, com mais de 6.000 habitantes.
Impunha-se, assim, a questão (que os autarcas esposendenses, infelizmente, não quiseram responder, nem tão pouco debater): deveria o concelho de Esposende, geograficamente pequeno, manter a sua divisão em 15 freguesias quando, por exemplo, uma freguesia, Marinhas, tinha uma população superior às populações de Fonte Boa e Rio Tinto juntas, ou às de Palmeira de Faro e Curvos juntas, ou ainda às de Belinho e Mar juntas – só para citar casos de freguesias que foram agregadas –?
O receio de gerar reacções negativas por parte da ala mais bairrista das freguesias, ou de comprometer o resultado eleitoral das eleições autárquicas que se avizinhavam, determinou, pois, que os autarcas esposendenses se escudassem no conforto do «não à redução de freguesias», ao invés de debaterem, como seria natural, o modelo de concelho para este século.
A reorganização das freguesias em Esposende acabou, assim, por ser feita sem qualquer intervenção por parte dos agentes políticos esposendenses.
Uma das alterações resultantes do novo mapa autárquico de Esposende prendeu-se com a criação da União das Freguesias de Apúlia e de Fão.
Tendo Apúlia maior população do que Fão, esperava-se que o primeiro presidente da nova freguesia fosse o apuliense Emílio Dias. No entanto, o povo acabou por trocar as voltas, e o vencedor da eleição foi mesmo o fangueiro Luís Peixoto, então presidente da junta de freguesia de Fão.
Empossado o primeiro elenco autárquico da União das Freguesias de Apúlia e de Fão, a respectiva Assembleia de Freguesia deliberou no final do ano passado, por maioria, localizar a sede da nova freguesia em Fão.
Tal votação acabou, como seria de esperar, por suscitar o descontentamento por parte de muitos apulienses.
Não concedendo no resultado da votação, um cidadão apresentou mesmo uma providência cautelar junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, tendo a decisão de localização da sede sido suspensa.
Tal providência foi, agora, em sede de recurso, julgada improcedente pelo Tribunal Central Administrativo do Norte.
Enquanto se vai travando uma batalha jurídica, a expensas dos contribuintes apulienses e fangueiros, a Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Apúlia e Fão acabou por voltar atrás na sua decisão sobre a localização da sede, tendo aprovado nova resolução segundo a qual a sede da junta irá funcionar, de forma alternada, em Fão e Apúlia. Uma medida que visa, certamente, pacificar o processo da localização da sede da União de Freguesias de Apúlia e Fão, mitigando os bairrismos exacerbados.
Este episódio apenas veio reforçar a constatação de que Esposende perdeu, lamentavelmente, uma boa oportunidade para rever, de forma livre, racional e objectiva, a reforma do seu mapa autárquico.
Fica, ao menos, a consolação de que, com a alternância da sede recentemente aprovada, apulienses e fangueiros continuarão Amigos para Siempre!

*Publicado no Jornal Notícias de Esposende, n.º 45/2014, 8 a 14 de Novembro

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