sexta-feira, 7 de abril de 2017

São Marino, o pequeno-grande das colinas.

 São Marino é talvez o mais pequeno dos grandes países.
 
 Admito que foram muitas particularidades que me fizeram visitar especificamente este país e prefiro realçar o orgulho e o sentimento de pátria que este pequeno país demonstra e acima de tudo, o sentimento de igualdade e de liberdade que encontrei na sua população.
 
 Seria fácil ironizar e dizer que em termos de área e população se assemelha ao concelho de Esposende, que é em conjunto com o Vaticano o único país europeu sem autoestradas, linhas férreas, discotecas e aeroporto próprio,  mas não vou por ai.
 
 Este é a mais antiga república domundo, elegendo os seus representantes parlamentares desde 1273. 
 
Situa-se sobre uma colina que ascende até aos 1000 metros de altitude e que nos permite deslumbrar Rimini e o Mar Adriático, propiciando que quase todos os restaurantes, bares e cafés sejam panorâmicos e com uma vista ótima para as fotografias. As suas 3 torres de vigia medievais são não só um marco paisagístico como um marco nacional estando inclusivamente no brasão nacional.
 
 Este parlamento por sua vez elege a cada 6 meses a sua dupla de presidentes, designados de capitães-regentes, já que se acredita que o poder não pode cair nas mãos de apenas uma só pessoa e desde esse ano a data dos empossamentos se mantém inalterada: 1 de Abril e 1 de Outubro. A cada mudança de regência temos uma das demonstrações de liberdade e igualdade mas acarinhadas pelos sanmarinenses: a alteração das leis. Nestas datas é dada a liberdade a todos os cidadãos de proporem novas leis ou alterações a leis vigentes diretamente ao Presidente do Parlamento e sempre se formam filas de cidadãos com novas propostas ao Parlamento.
 Não sou ingénuo, sei que é a dimensão do país que permite este contato direto entre o cidadão comum e o governo.
 
 Apesar de todos se conhecerem, existe um sentimento de respeito pelos cargos e pelas instituições.
 
  Enquanto visitava a sala central do Palácio Público fui interpelado pelos funcionários que lá estavam para me reter já que as capitãs-regentes iam passar para irem almoçar e enquanto esperei, a funcionária do Palácio transmitia-me que era um orgulho para todos o facto de serem duas mulheres, e isso ser uma estreia a nível mundial, e pelo facto de uma delas ter apenas 28 anos e ser a mais jovem presidente da república no Mundo, que deveria ter vindo 3 dias antes para assistir à cerimónia.
 
 Nos simples, mas elegantes, museus que existem neste país vemos uma quantidade absorta de funcionários e ainda vemos polícias sinaleiros para ruas muito poucas movimentadas e existem quase todos os serviços públicos expectáveis, desde o Ministério da Educação ao Ministério do Trabalho passando pela Biblioteca Nacional, o Comité Olímpico e a Universidade de Design o que me leva a crer que o Estado aqui é muitíssimo presente, apesar de existirem diversas instituições financeiras e independentes e uma presença de indústria muito admirável, aproveitando os baixos impostos que aqui se praticam. Como curiosidade, existe apenas uma produtora autorizada de peças de cerâmicas tradicionais.
 
 São Marino também se destaca pela sua independência na política externa.
 
 Numa longa linhagem de relações diplomáticas e de negociações, dispõem de um pequeno exército e não existem fronteiras físicas com Itália, sendo quase in percetível a passagem da fronteira. Ainda hoje se mostra com orgulho que foi aqui que Garibaldi se refugiou e que 100 mil italianos buscaram asilo aquando da 2ª Guerra Mundial.   
 É um país que apesar de utilizar o Euro como moeda não aderiu à UE, não reconheceu o Kosovo como estado independente e não aderiu aos boicotes à Rússia.
 Esta não adesão aos boicotes faz com que seja dos poucos que consiga exportar bens alimentares para a Rússia e lhe garanta um crescimento económico a longo prazo, sendo das poucas economias europeias que cresce à mais de 5 anos consecutivos e devido a uma política de baixos impostos para os nacionais o salário mínimo nacional é o 3º mais elevado na zona Euro, atrás do Luxemburgo e Mónaco. 
 
 O respeito que é dado à cidadania também é relevante.
 
 A cidadania é uma das mais difíceis de obter para um estrangeiro, sendo um pré-requisito  viver 35 anos na República sem nenhum incidente e ainda assim a sua candidatura é avaliada por uma espécie de Senado e o anúncio das candidaturas e a cerimónia de entrega dos passaportes é transmitido na televisão. É um dos factos que explica não termos uma legião de jogadores estrangeiros na sua equipa de futebol.
 
Com o sentimento de cidadania vêm também a proteção aos produtos locais.
 
 Sendo a agricultura um dos motores da economia, é com gala que se fala nos produtos de "Km 0", confeccionados dentro da República.  Desde o leite à cerveja, passando pelo pão e pela típica torta existe sempre um exemplar sanmarinense para qualquer produto sendo que aliado à qualidade temos um  preço em conta com os rendimentos desta região.
 
 E o futebol foi também algo que me fez vir a este país.
 
 Desde que comecei a acompanhar o futebol que me intrigava como seria aquela pequena seleção que insistentemente perdia jogos atrás de jogos e que considerava que sofrer menos de 4 golos era uma vitória. Muitas vezes abria o jornal desportivo para ver os resultados das seleções  e secretamente ficava na esperança que São Marino tivesse feito uma surpresa, muitas desilusões tive já que a seleção é aquela que à mais jogos está sem ganhar em toda a Europa. Quando chega a Junho e a Liga dos Campeões inicia com as primeiras pré-qualificações, é sempre uma expetativa enorme por aquilo que as equipas sanmarinenses possam fazer, a derrota é quase sempre o resultado final.
 
A seleção é um dos reflexos do sentimento de independência, sendo das poucas que é totalmente amadora mas que abraça todos os jogos com profissionalismo e um sentimento de amor à camisola invejável. Muitas vezes sofrer poucos é uma vitória e conseguir um golo é quase um feito. Insistentemente os jornalistas estrangeiros lhe perguntam porque não desistem, insistentemente lhe respondem porque representam um povo.
 
Já entrei em muitos estádios lendários, mas ter entrado no Serravalle com a seleção de sub-17 a treinar deu-me uma euforia infantil como em poucos estádios.
 
Mas não só de futebol se faz o desporto.
 
Existe também o Voleibol, o atletismo, o basebol, o futsal, o polo aquático e o tiro em voo não admirando por isso  que São Marino seja um dos dominadores dos Campeonatos dos Países Pequenos da Europa.
 
São Marino ficou na colina, mas algo me diz que não foi um "adeus" mas um "até já".

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