O mês de Março
aproxima-se e uma revolução silenciosa está iminente na indústria agrícola. Falo
do fim das quota leiteiras a nível europeu.
As quotas leiteiras
impostas pela União Europeia serviram para moderar a produção de leite em cada
um dos países, para que todos os intervenientes de cada país da indústria leiteira, dos
produtores às empresas transformadoras, não sofressem o ataque dos seus congéneres europeus, visto
que as disparidades na produção eram gritantes.
Quando um país ultrapassava a sua quota era
multado e isso refletia-se nos seus produtores, o que serviu para salvaguardar
a indústria leiteira portuguesa, entre outras, de serem engolidas por
potentados como Bélgica, Holanda, Alemanha, Polónia, Itália ou por outros.
Portugal, tendo sido
um país de agricultores, não foi um país de agricultura e esses números na
indústria leiteira são muito evidentes já que olhando para a quantidade de
leite de vaca recolhido Portugal fica em 15º lugar na Europa dos 28, ficando
atrás de países como Bélgica e República Checa,
e estando ao mesmo nível de Hungria e Lituânia. Em termos de preço pago
ao produtor, Portugal situa-se na média europeia mas os custos de produção são
mais elevados que a média europeia, logo o ganho efetivo tende a ser mais baixo que a média europeia.
O grande fator para
isto, na minha opinião, é o ordenamento do território agrícola. Os nossos terrenos são demasiado dividos,
onde na Polónia está 1 terreno em Portugal nessa mesma área estão 10, onde na
Polónia apenas 1 trator é necessário para trabalhar o terreno em Portugal
existem 10, onde na Polónia existe apenas 1 agricultor em Portugal existem 10
para dividir o lucro do que sai do terreno. Além desta parcelização do terreno existem
fatores naturais, como a quase inexistência de grandes extensões de terrenos
que permitam aos animais de alimentarem apenas de erva que cresce por natureza,
ou seja, enquanto o agricultor na Polónia precisa, valor imaginário, de 1 € para
alimentar os seus animais o agricultor em Portugal precisa de 4€.
Ainda a prejudicar
mais o panorama, o nosso mercado nacional está muito orientado para artigos de longa-duração,de
prazos de validade elevados como o leite UHT,queijo flamengo e iogurtes
líquidos, o que permite a fornecedores na Polónia enviar os seus produtos para
Portugal sem que ele se estrague. No caso do Reino Unido, por exemplo, o leite “fresco”
domina o mercado e tendo um prazo de validade de 4 dia faz com que se o produto
sair da Polónia na segunda-feira só está nas prateleiras na quarta-feira e
quinta já acabou a validade, logo pouco interessante para o consumidor
As culpas, na minha opinião, para este panorama a nível
português são para todos os intervenientes na agricultura, desde o Governo às
empresas de transformação, passando por Cooperativas, produtores, retalhistas,
grossistas, comerciantes, mas não posso realçar que se hoje estamos neste
ponto, muito o devemos a António Barreto e à sua “Lei Barreto” que ao renegar a
coletivização dos terrenos no Alentejo e no Ribatejo matou à nascença uma
agricultura de escala e deu o mote para a tribalização dos nossos terrenos e
dos nossos recursos. Em 20 anos Portugal
perdeu 90% dos seus produtores de leite, mas aumentou a sua produção, porque
quem trabalha faz-lo em maior escala. Poderíamos ter feito este percurso à 40 e
hoje estaríamos num outro patamar e isso António Barreto não o pode negar.
Se ele me estiver a ler, daqui lhe digo: Enganou-se,
devíamos ter cultivado o Alentejo de cima a baixo sim senhora.
No concelho de Esposende
contamos com cerca de 54 produtores de leite, segundo dados da Anabel, não sendo
um valor extraordinário é um valor que
já nos coloca à frente de concelhos como Chaves, Viana do Castelo, Braga,
Guimarães, Aveiro, Santarém, Vila Nova de Gaia.
Em termos médios, e
aqui falo de números aproximados e médios porque o preço da matéria não é
constante durante o ano, por isso é natural que não sejam estes os valores de
2014, o concelho de Esposende produziu cerca de 12 milhões de litros de leite,
o que pago a cerca de 0,27€ o litro de leite representou um encaixe de 3 milhões de euros
para a economia do concelho. Com o término das quotas e a consequente redução
de preço, que ficará na melhor das hipóteses a 0,03€ por litro, isso significa
que para este ano a economia do concelho perde cerca de 200 mil euros . Em
cenários mais pessimistas poderemos estar a falar de 400 mil euros em perdas. Se existir um abandono mais generalizado dos produtores, os valores ainda serão mais gravosos.
Sem os produtores de
leite não existe venda de rações, máquinas, gasóleo, animais, instalações,
produtos químicos de limpeza, veterinários, compra de terrenos agrícolas para
exploração, etc. É todo um mundo de negócios que desaparece. Isto são mais do que
motivos e números para que as nossas autoridades locais, desde a Câmara
Municipal, Cooperativa Agrícola , Associações Comerciais, olhem para os
produtores de leite e para esta situação com preocupação e com celeridade na
resposta. Algo terá de ser feito, desde o aproveitamento do que é aqui
produzido até à reformulação da forma como o estamos a produzir e dos custos
que isso representa para os agricultores em si.
Desconheço, por
ignorância ou por falta de atenção, se existe algum plano de acção, algum
acompanhamento desta situação, se alguém já ouviu os agricultores, se já algo
foi feito.
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